segunda-feira, 2 de julho de 2007

Homoparentalidade vista com franja


Ontem na TVI passou uma reportagem sobre casais lésbicos que recorrem a dadores de esperma para fazer auto-inseminação (sem que haja relação sexual com um homem). Não posso comentar toda a reportagem, porque só vi parte. O que vi pareceu-me relativamente cuidado e equilibrado, apesar de superficial, o que está de acordo com o formato e meio de difusão. Pena continuarmos a ter os técnicos a dar a cara e os envolvidos a escondê-la: reflexo de uma sociedade estigmatizante e punitiva face à diversidade sexual. Relativamente ao desfecho da mesma, a jornalista responsável pela reportagem- Elisabete Barata- rematava e marcava golo argumentando que estas lésbicas têm instinto maternal. A este propósito pergunto:


* Será que a maternidade, explicada pelo tal “instinto”, continua a ser desígnio e factor de validação social da mulher?
* E as lésbicas e as mulheres que não querem ser mães? Não têm instinto? Têm um défice no cromossoma X, ou outro défice qualquer, que as torna menos representativas do género feminino?
* E os casais homossexuais masculinos que querem exercer a homoparentalidade, também têm instinto maternal? Se calhar têm instinto parental. Ou paternal? Ou um cromossoma X a mais?
* E se isso do instinto (maternal, paternal, parental) não passar tudo de uma grande construção pseudo-científica com pés de barro?
* E se, só “se”, estes casais não tiverem um projecto marcado pelo ”instinto”, mas sim pelo amor: uma pela outra e também por uma criança que desejam criar em conjunto e que são capazes de amar? Em caso afirmativo isso significa que reúnem algumas das condições básicas para exercer a parentalidade: planeamento da mesma e investimento emocional de qualidade.

5 comentários:

Su disse...

Patrícia,
Acabei de descobrir com mta satisfação o seu blog. E, para lá da frase introdutória, com a qual tematicamente me identifiquei, eis que leio no último post:
"E as lésbicas e as mulheres que não querem ser mães? Não têm instinto? Têm um défice no cromossoma X, ou outro défice qualquer, que as torna menos representativas do género feminino?"
Sendo uma hetero de 33 anos que assumidamente ñ quer ser mãe, lido diariamente com o rótulo da anormalidade da escolha e do egoísmo do meu ser. Pergunto-me, até, se não serei, de facto estranha por não sentir apelo pelo tal amor incondicional...
Parabéns pelo blog!
Su

Anónimo disse...

Concordo plenamente com a Su, já num comentário abaixo falei disso, sobre a pressão a que quem não quer ter filhos é sujeito, os rótulos que colocam e se eu sinto isso na pele sendo homem, sei e vejo que nas mulheres é ainda pior. O ter filhos não pode ser visto como um requisito para que nos considerem seres humanos sensiveis com capacidade de amar. Eu considero ter uma grande capacidade de amar, mas simplesmente não quero ter filhos e não posso aceitar que me rotulem seja do que for por isso. Quanto aos casais homossexuais seja homens ou mulheres não coloco em causa a capacidade de dedicação e amor que podem dar a uma criança, mas coloco uma dúvida, será que é a situação ideal para uma criança? não sei se sim nem se não, mas é uma dúvida que tenho e acreditem não tem qualquer tipo de preconceito, é uma situação realmente com muitos ses.

Lilith disse...

Há um estudo, não me recordo se da Elizabeth Badinter (antropóloga) que põe justamente em causa o tão faldo instinto maternal. Inato, ou adquirido?

Anónimo disse...

Que saudades da letra L! Que lindas! Quanto aos temas propostos:
- quando o meu filho nasceu, não fui iluminado pelo raio do amor. Apareceu-me uma criatura desprotegida (aqui para nós que ninguém nos ouve, feiazita...) que precisava de muitos cuidados. Está ali ao lado a dormir, agora com quatro anos e com cabedal suficiente para me proteger a mim. O amor, é reafirmado mutua e diariamente.
- Essa coisa da discriminação aos que não tem filhos... As mais das vezes acho que é mais uma pressão dos avós, que querem netinhos
- Por fim, o argumento de que "talvez não seja o melhor para as crianças", percebendo que a intenção do autor não parece má, pode ser no entanto muito delicado. Dizia-se o mesmo das crianças filhas de pais divorciados ali no fim dos anos 70, início dos 80...
Pessoalmente, sou absolutamente a favor desse direito. Haja vontade, capacidade de dar e condições para tal.

Anónimo disse...

Acredito que o amor não é um acto passivo que se reduz à emoção e ao sentimento. Outros elementos mais profundos e essenciais são a vontade, a escolha, o desejo e a decisão de amar. Também existe liberdade no amor, ou não? Caso contrário não passaria da satisfação egoísta de um instinto.
Parabéns pelo blog.